Por Corey Eddy e Jana M. del Favero
Dois peixes-leão já foram avistados no Brasil, ambos na região de Arraial do Cabo (RJ), um primeiro em 2014 e o segundo agora recentemente, em março de 2015. Mas, se só foram dois exemplares, por que se preocupar?
Antes de continuar a leitura assistam o curto vídeo do programa Fantástico da rede Globo (acesse aqui), para maiores informações dos problemas que essa espécie, de origem do Indo-Pacífico, causa atualmente no Caribe e para que se tenha uma noção do quão rápido que ela se alastrou por lá.
Os especialistas brasileiros ainda estão debatendo como esses Peixes-leão foram parar em águas brasileiras e se há mais indivíduos em águas mais profundas, que não seriam observados por mergulhadores (detalhes aqui). Porém, enquanto não há um consenso, fui conversar com um colega da University of Massachusetts (EUA) que estuda a população invasora de Peixe-leão nas Bermudas, para saber o que está sendo feito por lá e que medidas poderiam ser adotadas no Brasil. Abaixo traduzo o que ele me contou:
Desde a descoberta do Peixe-leão na Flórida (EUA) em 1985, sua população expandiu rapidamente da Venezuela até Rhode Island (EUA). Pesquisadores acreditam que sua expansão pode eventualmente atingir até o Uruguai. E então, desde o ano passado, dois Peixes-leão já foram avistados no Brasil!
Esquema representativo da distribuição do peixe-leão ao redor do mundo. Diagramação por Naira Silva. Fonte
Como em seu ambiente de origem, o Indo-Pacífico, os Peixes-leão são reconhecidos e evitados pelas suas presas, eles evoluíram para predadores oportunistas com dieta ampla (em outras palavras, comem de tudo o que tiver disponível). Porém, devido a ingenuidade de suas presas no ambiente invadido, os Peixes-leão são capazes de selecionar e consumir grandes quantidade de invertebrados, peixes juvenis e peixes adultos pequenos, muitos dos quais desempenham importantes papéis ecológicos e econômicos. Para se ter um ideia, os Peixes-leão podem reduzir as populações de peixes juvenis de um recife em quase 80% em menos de cinco semanas!
Além disso, amparado pela ausência de um predador verdadeiro, populações de Peixe-leão no Atlântico têm atingido densidades bem maiores do que no Pacífico, afetando a estrutura da comunidade, a biodiversidade e a saúde de recifes de coral. Felizmente, eles são deliciosos, e demora somente 1 minuto para remover os perigosos espinhos, tornando-os perfeitamente seguros para manusear. Se houver pesca de Peixe-leão, nós poderemos salvar o oceano. “We have to eat them to beat them” (Nós temos que comê-los para vencê-los).
Meu trabalho de doutorado é parte de um projeto financiado pelo “UK’s Department of Environment, Food and Rural Affairs” que está investigando características biológicas e ecológicas da população de Peixe-leão ao redor das Bermudas e o impacto que eles podem causar na estrutura e funcionamento do ecossistema recifal de lá.
Para o meu primeiro capítulo eu vou utilizar dados de abundância e distribuição do Peixe-leão para estimar o tamanho populacional. Os peixes são coletados através de mergulhos em 15 locais e em 5 diferentes profundidades (10, 20, 30, 45 e 60 m) usando uma lança. Todos os indivíduos coletados são pesados, medidos, dissecados e processados para futuras análises. Depois de um ano, todos os locais são novamente observados para calcular a taxa de recolonização. Esses dados também irão facilitar o desenvolvimento de um mapa que auxiliará as atividades de remoção do Peixe-leão em locais-chave.
Nos próximos capítulos estudarei a história de vida dessa espécie para calcular o seu crescimento populacional. Para calcular crescimento e quanto tempo o Peixe-leão vive, utilizarei o otólito dos indivíduos capturados tanto durante a pesquisa, quanto por outros mergulhadores e pescadores (Não lembra o que é otólito? Clique aqui). Além disso, através das gônadas vou analisar os aspectos reprodutivos e estimar a fecundidade (quantos “ovos” são desovados por cada fêmea em média).
Por fim, analisarei o estômago do Peixes-leão amostrados para saber o que eles estão comendo nas Bermudas, investigando os impactos que eles podem estar causando em peixes e invertebrados nativos e identificando fatores que podem influenciar a distribuição da população.
Quando finalizado, meu doutorado irá ajudar o “Lionfish Task Force Bermuda” (http://www.lionfish.bm) e o Departamento de Proteção Ambiental local no desenvolvimento de um plano para a remoção a longo prazo desta espécie de águas locais. Controlar e reduzir o crescimento contínuo da população de Peixe-leão é uma parte crucial de qualquer esforço para minimizar os impactos negativos sobre as espécies de peixes nativas e os ecossistemas de recifes de coral, e evitar impactos secundários sobre a pesca e o turismo.
Além de minha pesquisa de doutorado, estou profundamente envolvido na educação pública e uma das minhas atividades pode ser uma ideia muito útil para o Brasil. Como voluntário para a “Ocean Support Foundation” (http://www.oceansupport.org), eu gerencio “Bermuda Lionfish Culling Program” (programa de abate do Peixe-leão). Este programa permite que qualquer residente das Bermudas, com mais de 16 anos de idade, possa receber a formação adequada e uma autorização especial para caçar Peixe-leão. Até o momento, temos certificadas mais de 500 caçadores, os quais são uma grande ajuda na remoção do Peixe-leão e na manutenção dos recifes. Como o Brasil foi invadido só recentemente, o momento inicial é perfeito para mobilizar mergulhadores, pescadores e ambientalistas para entrar na água e começar a caçada. Cada Peixe-leão que é removido ajuda muito para preservar e proteger o ambiente marinho do Brasil, especialmente quando ainda são poucos os Peixes-leão observados nas redondezas.
Sobre o convidado:
Corey Eddy é doutorando na Universidade de Massachusetts Dartmouth (EUA). Ele fez a graduação na Universidade de Rhode Island (EUA), cujo programa levou-o para Bermudas por um semestre no “Bermuda Institute of Ocean Sciences”. Quando estava por lá passou a realizar as atividades descritas no texto. Os seus interesses concentram-se em estudar as características da história de vida, uso de habitat e ecologia alimentar de predadores ecologicamente importantes.
Contato: corey.eddy@umassd.edu
Comments