Você já deve ter ido, passado ou até mesmo nadado em um estuário. Afinal, ao redor dos mesmos estão estabelecidas as maiores cidades e os maiores portos do mundo. Além de ser uma área importante para a navegação e ao urbanismo, os estuários são áreas de reprodução, habitat e alimentação para inúmeras espécies, sendo diversas delas de interesse pesqueiro. Mas antes de detalharmos sua importância econômica e ecológica é preciso perguntar: você sabe mesmo o que é um estuário?
Um estuário é um corpo de água semi fechado localizado no limite entre continente e oceano e no qual as águas do rio e do oceano se misturam. A palavra “estuário” é derivada do latim aestuarium, que significa “dependente de maré”. São nos estuários que os rios começam “a sentir” o ritmo das marés.
O tipo de estuário mais comum é desembocadura de um rio, mas algumas baías, golfos, enseadas também podem ser considerados estuários.. Os estuários que temos hoje espalhados pelo mundo surgiram depois o último máximo glacial. Nesse período glaciares imensos cobriam uma grande parte da Europa, América do Norte e Ásia e, quando derreteram, fizeram o nível do mar subir aproximadamente 120 m, ou seja, até o nível que temos hoje. Isso levou a inundação de regiões costeiras e, onde haviam leitos de rios ou outros baixios, formaram-se estuários.
As flutuações de salinidade estão entre as principais características dos estuários. A periodicidade das marés faz com que a água salgada do mar entre no estuário durante o período de maré alta e saia durante a maré baixa, permitindo o predomínio da água “doce” do rio que desemboca no estuário. Além dessa oscilação da maré, a salinidade nos estuários ainda varia por causa das mudanças no regime de ventos, chuvas e evaporação. Inclusive, em alguns estuários, como o da Lagoa dos Patos no RS, a ação dos ventos é mais importante do que a maré.
A alta variabilidade na salinidade representa um alto custo energético aos organismos que vivem nos estuários, pois há a necessidade de ajuste fisiológico a essas mudanças (osmorregulação). Como resultado, um baixo número de espécies conseguem permanecer por longos períodos nos estuários e são consideradas estuarino residentes. A maioria das espécies encontradas nos estuários apenas utilizam estes ambientes em uma determinada fase do seu ciclo de vida ou como rota de migração. Assim sendo, os organismos encontrados nos estuários são de origem marinha, límnicos (ou dulciaquícolas) e estuarinos (ou de água salobra), e podem ser classificados como: 1) estenoalinos: organismos que não toleram (ou toleram muito pouco) mudanças de salinidade, como o peixe-espada (Trichiurus lepturus) de origem marinha, e 2) eurialinos: toleram mudanças na salinidade e são capazes de se deslocar para o interior do estuário, como a corvina (Micropogonias furnieri).
A vegetação estuarina também é caracterizada por um número limitado de espécies. Além da variação da salinidade, os estuários são muito homogêneos quanto ao substrato, sendo a maioria de fundo lamoso, o que dificulta a fixação das plantas e das macroalgas. Além disso, a turbidez das águas estuarinas restringe a penetração da luz, dificultando a presença de plantas e macroalgas que crescem submersas. De uma maneira geral, podemos dizer que nos estuários localizados em zonas temperadas são comumente encontrados os marismas, que são substituídos pelo manguezal na paisagem dos estuários tropicais e equatoriais.
Apesar de toda a adversidade citada, os estuários estão entre os ecossistemas mais produtivos do planeta, pois os rios trazem grandes quantidades de nutrientes, que agem como “fertilizantes”, ao mesmo tempo que as ondas e marés ajudam a manter a água bem ventilada com oxigênio e agitam o sedimento, ressuspendendo nutrientes e matéria orgânica do fundo. Esses processos sustentam a produção primária de fitoplâncton, algas bentônicas e gramas marinhas que sustentarão níveis tróficos superiores. Assim, as poucas espécies de animais adaptadas às adversidades do estuário, se beneficiam da alta abundância de suprimento alimentar, da reduzida competição por alimento e espaço, e da pouca predação.
No entanto, devido a sua proximidade com zonas urbanas, industriais e portuárias, os estuários também recebem uma quantidade grande de contaminantes, tais como esgotos, fertilizantes, praguicidas, hidrocarbonetos de petróleo e metais. Isso coloca em risco a qualidades das águas, a sobrevivências dos organismos que ali habitam e podem gerar danos a saúde a quem ingerir peixes e frutos do mar de regiões estuarinas.
Não muito tempo atrás, os habitantes das zonas costeiras eram despreocupados com seu impacto na qualidade da água dos estuários. Argumentava-se que os estuários eram limpos diariamente pelas marés, como se as mesmas agissem como a descarga da nossa casa. Infelizmente, este não é o caso. Poluentes são facilmente retidos no sistema (subprodutos do petróleo, metais pesados, fertilizantes, esgotos e pesticidas, entre outros), gerando diversos tipos de poluição e contaminação. Precisamos com urgência preservar esses ambientes tão frágeis e tão importantes aos humanos e a diversos outros animais.
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