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Você conhece algum cientista brasileiro?


Lembro-me de uma vez, quando eu estava fazendo o mestrado, que uma criança me perguntou o que eu fazia. Na hora eu fiquei paralizada por vários segundos, porque se já era difícil explicar para os meus pais o que eu fazia, imagina para uma criança! Mas na hora respondi: sou cientista! - achando que a criança iria entender e ter curiosidade para saber mais daquela instigante profissão. Mas pela cara de interrogação dela, vi que se eu tivesse falado que fazia mestrado com corantes vitais para monitorar o fitoplâncton marinho da água de lastro de navios, ia dar na mesma!


Como eu já estava acostumada com essas reações, após eu contar o que eu fazia, nem fiquei frustrada. Mas até hoje tenho um sentimento de que podemos e devemos divulgar mais a ciência! Não é culpa da criança não entender o que um cientista faz. O que falta é divulgação desta carreira, não só através da mídia e dos diversos canais de comunicação, como também por nós cientistas.


Um estudo divulgado na 67ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), sobre o interesse dos brasileiros em Ciência e Tecnologia (C&T) demonstrou que os brasileiros possuem 67% de interesse em C&T, enquanto os europeus manifestam 53% de interesse. Porém, a pesquisa enfatiza que apesar deste grande interesse dos brasileiros, há baixo acesso a esse tipo de informação no país e que as pessoas têm dificuldades para saber onde encontrar estes assuntos, ainda mais de fontes confiáveis, sendo que a maioria delas buscam em programas de televisão.


Apesar do significativo interesse em ciência da população brasileira, os cientistas possuem certas dificuldades para divulgar sua pesquisa para a sociedade. Embora o currículo lattes já tenha um local especial para indicar quando o pesquisador trabalha com popularização de ciência e tecnologia, essas atividades tendem a ser deixadas para segundo plano, pois dentro das universidades e centros de pesquisa, a pressão para publicar os resultados em revistas científicas específicas é muito grande e a linguagem utilizada nessas revistas é bem diferente da linguagem de divulgação para o grande público. E mesmo que o pesquisador tenha vontade de divulgar sua pesquisa em outros canais de comunicação, este tipo de atividade ainda não é amplamente valorizada no mundo acadêmico, embora os três pilares da universidade sejam ensino, pesquisa e extensão. Para quem não sabe, extensão tem a ver com a interação entre universidade e comunidade, e divulgação de ciência é uma atividade de extensão.


Infelizmente, o que ocorre é que se o pesquisador investir tempo em divulgar suas descobertas e avanços em uma linguagem mais acessível, geralmente em blogs, redes sociais, revistas gerais e reportagens, ele pode ficar em desvantagem em sua carreira científica por não alcançar a produtividade esperada, em termos de publicação em periódicos internacionais específicos. Afinal de contas, a principal métrica utilizada para avaliar a produtividade de um pesquisador é baseada na quantidade de artigos publicados em periódicos internacionais de sua área específica. Na prática o que acontece é: se um pesquisador não alcançar um certo número de artigos publicados nessas revistas por ano ele vai sofrer as consequências, podendo chegar a ser descredenciado de cursos da pós-graduação. Em outras palavras, ele pode ficar mal posicionado perante seus colegas e às agências financiadoras, que hoje valorizam apenas um único tipo de produção acadêmica no momento da liberação de  verbas para pesquisas.


Mas não é apenas dentro das universidades e centros de pesquisa que essa falta de incentivo ocorre. Faltam também alicerces para que jovens cientistas possam se interessar, estudar e exercitar a divulgação científica em massa. No Brasil ainda são poucos os cursos voltados para a formação de “Divulgadores Científicos”, à exemplo dos cursos oferecidos pelo Labjor e pelo Museu da Vida. Para algumas pessoas pode ser mais fácil, mas na maioria das vezes não é trivial “traduzir” um estudo técnico científico para uma linguagem clara e amplamente acessível, sendo de grande valor uma formação especializada. Esta é uma profissão igualmente apaixonante e muitos profissionais dedicam-se somente à esta atividade, “traduzindo” estudos das mais variadas áreas para o público geral. São cientistas, jornalistas e profissionais da comunicação que se dedicam em restabelecer a “ponte” entre os produtores de ciência e sociedade.


Mas será que toda a origem deste problema está nas universidades e na ineficiência da divulgação? Não podemos deixar de mencionar o papel do ensino fundamental e médio em estimular o interesse das crianças e adolescentes pela ciência! Não é apenas para formar profissionais da área, mas as competências desenvolvidas quando se faz ciência como curiosidade,organização, elaboração de experimentos, métodos, testar hipóteses, solucionar problemas e raciocínio lógico, são muito importantes para o desenvolvimento humano em qualquer área.


Apesar de ainda haver poucas escolas com disciplinas dedicada à filosofia da ciência, existem algumas iniciativas de Institutos, Fundações e até mesmo de universidades. Um exemplo é o programa Febrace da Universidade de São Paulo, que tem como objetivo aproximar escolas públicas e privadas das universidades e estimular o contato de adolescentes com a ciência através de projetos criativos e inovadores (detalhes aqui). No final do programa, há premiação para os alunos com os melhores projetos. Quem sabe, deste programa não surgirão futuros jovens cientistas? Pelo menos todos terão a experiência de ter feito ciência e saberão um pouco mais sobre essa profissão.


Um outro déficit é a pequena divulgação da pesquisa científica para as empresas do país. Muitas acabam importando a tecnologia de fora ou gastando tempo e dinheiro nos seus setores de Pesquisa e Desenvolvimento, sendo que alguma universidade já está desenvolvendo o mesmo feito. Ou seja, a falta de comunicação entre eles reflete até na baixa contratação dos jovens cientistas que querem atuar na pesquisa aplicada. A Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e diversas agências de inovação das universidades têm feito grande esforço para aproximar e fomentar a inovação entre universidades e empresas (tema para outro post).


Mas não são só problemas. Uma recente tecnologia tem aproximado mais a sociedade dos cientistas. O crowdfunding é uma plataforma online em que as pessoas postam seus projetos para conseguir financiamento coletivo. Neste caso, o pesquisador posta seu projeto de pesquisa, explicando seus objetivos de maneira clara, além dos benefícios que trará e os custos de cada etapa. Neste momento é crucial explorar o “marketing científico”, pois a própria população irá julgar o projeto e aqueles que se engajarem na causa contribuirão financeiramente para o projeto acontecer.


Resumindo, apesar destas excelentes iniciativas, ainda estamos longe do ideal de divulgação da ciência e tecnologia no Brasil. Vamos fazer um pequeno teste: Você sabe me dizer o nome de um grande cientista brasileiro? E o que ele fez? Comente no final desse post e conte para nós qual cientista brasileiro você conhece! Se a ciência fosse mais incentivada no país, teríamos mais divulgação desta carreira, maior valorização e um número maior de jovens interessados, com potencial para se tornarem grandes cientistas, melhorando o desenvolvimento tecnológico e econômico do nosso país.


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